quinta-feira, 30 de abril de 2009

Quando eu morrer

Dedicado a Mário de Sá-Carneiro

Quando eu morrer,
Soltem gargalhadas
E batam palmas sem parar.
Que se façam os sinos tocar
Mas em desconexas badaladas.

Que se contem anedotas apimentadas
E se faça chacota do meu ar.
Sobre o caixão ponham licor para eu tomar
E algumas mortalhas para serem fumadas.

Quando eu morrer,
Digam nomes ordinários
E façam os outros de otários
Rebolando no chão sempre a rir.

Quando eu morrer,
Rebentem balões,
Dêem pinotes e trambolhões
E fiquem com nódoas negras de tanto cair.

Lígia Laginha

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Cantiga da Ribeirinha

Foi o primeiro texto publicado em português

No mundo nom me sai parelha,
mentre me for'como me vai,
cá ja moiro por vos - e ai
mia senhor branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi en saia!
Mau dia me levantei,
que vos enton non vi fea!

E, mia senhor, des aquel di'ai!
me foi a mi muin mal,
e vos, filha de dom Paai
Moniz, e bem vus semelha
d'aver eu por vos guarvaia,
pois eu, mia senhor, d'alfaia
nunca de vos ouve nem ei
valia d'ua correa ...

Paio Soares de Taveirós

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Canção do Exílio

Minha terra tem palmeiras
Onde canta o sabiá,
As aves que aqui gorgeiam,
Não gorgeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida tem mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá.
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá.

Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá,
Em cismar sozinho à noite,
Mais prazer encontro eu lá.
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá.

Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá,
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá,
Sem qu'inda aviste as palmeiras
Onde canta o sabiá.

Gonçalves Dias-Coimbra, Julho de 1843